Pioneiro do rock brasileiro e parceiro do Rei Roberto morre aos 81 anos. O Tremendão deixa saudades e uma obra de 600 canções e mais de 40 álbuns gravados ao longo de seis décadas

 

Um dos gigantes da Música Popular Brasileira, o cantor e compositor carioca Erasmo Carlos morreu na terça-feira, 22, aos 81 anos, no Rio de Janeiro. Um dos pioneiros do rock brasileiro, fundador da Jovem Guarda com o eterno parceiro Roberto Carlos, Erasmo vinha enfrentando problemas de saúde, portador de uma edemigênica, que causa acúmulo de líquido nos tecidos do corpo, provocando edemas e inchaços. A síndrome é consequência de problemas em órgãos como fígado e coração.

Autor de mais de 600 músicas e de clássicos como “Sentado à Beira do Caminho”, “Minha Fama de Mau”, “Mulher”, “Quero que tudo vá para o inferno”, “Mesmo que seja eu” e “É proibido fumar”, o artista deixa uma legião de fãs e amigos que fez ao longo da sua longa carreira, que começou no final dos anos 50. Erasmo nasceu na Tijuca, em 5 de junho de 1941 e era amigo de infância de outras lendas do bairro, como Tim Maia e Jorge Ben.

Na adolescência, gostava de se reunir com a turma no Bar do Divino, na Rua do Matoso. Foi nessa época em que conheceu Roberto Carlos, durante um concerto de Bill Haley no Maracanãzinho – o que teria aberto os olhos do carioca para começar seu próprio grupo de rock. Antes da carreira solo, fundou os Snakes, ao lado de outros amigos do bairro, mas que só durou até 1961.

Em seguida, Erasmo se tornaria vocalista do Renato & Seus Blue Caps. Foi ele quem garantiu a contratação do conjunto por uma gravadora e fez sucesso em uma faixa ao lado de Roberto Carlos, marcando o início da parceria entre os dois. Erasmo compôs mais de 500 canções com o amigo. Ainda nos anos 1960, a dupla já se destacaria na linha de produção do pop, selando uma parceria que atravessou gerações, como Lennon & McCartney.

Entre 1965 e 1968, junto com Roberto e Wanderléa, tornou-se um rosto conhecido nacionalmente na esteira do programa Jovem Guarda, na TV Record. Transmitido todos os domingos, o programa trazia o trio que causava furor e tomou a audiência de assalto, chegando aos aparelhos das principais cidades do país graças ao videotape, diretamente da rua da Consolação, em São Paulo.

Foi sob a influência do rock and roll dos anos 1950 e 1960, mas principalmente dos Beatles, que Erasmo, Roberto e Wanderléa se tornaram os primeiros músicos no país com carreiras impulsionadas pela TV. E tomaram o país.

Ele também se transformou em astro do cinema, estrelando filmes ao lado do Rei e da Ternurinha, como “Roberto Carlos e o Diamante Cor-de-Rosa” (1968) e “Roberto Carlos a 300 Quilômetros por Hora” (1972). Ainda em 1972, estrelaria o filme “Os Machões”, ao lado de Reginaldo Faria, também diretor, e de Flávio Migliaccio.

Sua estreia na telona, contudo, ocorreu em 1958, quando ele e Roberto fizeram uma ponta na chanchada “Minha sogra é da polícia”, como parte de uma banda de rock fictícia liderada por Cauby Peixoto — ideia de ninguém menos que o produtor Carlos Imperial, que praticamente criou a Jovem Guarda. O movimento criado pelos amigos da Tijuca virou o Brasil do avesso e colocou a juventude na mira de uma revolução musical que ganhou na Ilha de Vera Cruz a força de uma ‘beatlemania’.

Não havia quem fosse jovem em meados dos anos 60 e não fosse atingido pelo turbilhão pop capitaneado pelo trio da Jovem Guarda, que revolucionou a MPB, para desgosto dos caretas. Nem todos os futuros ícones da música nacional, contudo, fizeram cara feia para o movimento do iê-iê-iê. Houve quem tivesse entendido de cara a sublevação do movimento artístico.

Essa turma eram os futuros tropicalistas. Foi na esteira do programa televisivo “Jovem Guarda” que Erasmo se aproximou dos baianos Caetano Veloso e Gilberto Gil, fundadores do movimento que representou uma ruptura na linha evolutiva da MPB. Os dois artistas passaram a flertar abertamente com o rock britânico, misturando-o ao baião e forró e outros ritmos estrangeiros, causando a fúria dos puristas. Quem chamou a atenção dos baianos para o trabalho da Jovem Guarda foi Maria Bethânia. Não se pode esquecer que, em pleno ano de 1967, houve quem liderasse uma passeata de artistas contra a guitarra elétrica. Loucura.

Mas, ele e Roberto jamais saíram do panteão olímpico. E Erasmo, apesar da fama de mau, passou a ser conhecido como Gigante Gentil pelos muitos amigos que fez ao longo dos anos. Foi querido por gerações de outros talentos da MPB. Ao longo de mais de 60 anos de carreira, estabeleceu parceria com muitas estrelas, além de Roberto e Wanderléa. E gravou com Chico Buarque, Lulu Santos, Zeca Pagodinho, Skank, Los Hermanos, Djavan, Adriana Calcanhotto, Marisa Monte, Frejat, Marisa e Milton Nascimento. Agora, deixa a saudade. E canções memoráveis. •