O número de pessoas que compõem a força de trabalho diminuiu no último trimestre de 2016, de 102,3 para 100,9 milhões de pessoas

Ano 1 – nº 07 – Setembro 2016

Incerteza e insegurança no mercado de trabalho e no quadro social no Brasil

Dados recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (PNADC-IBGE), dos meses de junho, julho e agosto de 2016, deixam claras as perdas que o mercado de trabalho brasileiro vem acumulando nos últimos tempos.

O número de pessoas que compõem a força de trabalho diminuiu no último trimestre de 2016 (de 102,3 para 100,9 milhões de pessoas). Esta redução mostra uma inversão do aumento que vinha ocorrendo desde o início do ano passado.

Porém, os dados mostram que o número de pessoas ocupadas, que era de 90,8 milhões de pessoas no trimestre de março a maio deste ano, encolheu para 90,1 milhões de pessoas (uma redução de 712 mil pessoas), retomando uma tendência de queda que já vinha ocorrendo desde o início de 2015, mas que havia apresentado uma pequena reversão no primeiro trimestre deste ano (quando havia aumentado em 159 mil pessoas). Assim, fica claro que a quantidade de pessoas que estavam usando sua força de trabalho no período diminuiu, e esta redução não parece ser temporária, já que segue uma tendência. A situação fica ainda pior quando se compara o último trimestre deste ano ao mesmo período do ano passado. Neste caso, o número de ocupados sofreu redução de quase dois milhões de pessoas (ou 2,2%).

Em contrapartida, aumentou o número de pessoas desocupadas (em 584 mil, ou 5,1%) no último trimestre de 2016, mantendo uma tendência que também vem do início do ano passado. E quando comparado ao mesmo período do ano anterior, este aumento foi ainda maior (3,2 milhões, ou um acréscimo de 36,6%).

Além do aumento do desemprego, os dados mostram uma tendência ao aumento do trabalho informal (que não conta com a proteção das leis trabalhistas) e redução do trabalho formal. Isso porque, conforme a PNADC, a quantidade de postos de trabalho no setor privado, com carteira assinada que, era de 34,4 milhões entre março e maio deste ano, sofreu uma redução de 268 mil pessoas. No trimestre de junho a agosto de 2015, este número era de 35,5 milhões. Assim, quando comparado ao mesmo período do ano anterior, a redução no número dos que trabalhavam com carteira assinada foi ainda maior, de 3,8% ou quase 1,4 milhão de pessoas. Nota-se que o emprego com carteira assinada vem seguindo uma tendência de queda, que já ocorre desde 2015. Em contrapartida, o emprego no setor privado, sem carteira assinada, que vinha diminuindo entre o último trimestre do ano passado e o primeiro deste ano, teve pequeno aumento no último trimestre, de 121 mil trabalhadores.

O nível de ocupação também vem caindo desde 2015 e, no último trimestre, caiu de 54,2%. Em comparação ao mesmo trimestre do ano anterior, o nível de ocupação foi reduzido de 56% para 54,2% (quase 1,9%).
O nível de desocupação, que se mantinha estável entre julho e novembro de 2015, iniciou uma trajetória de ascensão a partir do final deste mesmo ano e continuou crescendo no ano de 2016 – finalizou o último trimestre com 7,2% de aumento. Embora o aumento seja pequeno, de apenas 0,30%, quando se compara o trimestre de junho e agosto com o anterior (março e maio), nota-se um crescimento de 1,8% no nível de desocupação quando comparado ao mesmo período do ano anterior.

Quando se analisa a taxa de desocupação, vê-se que a quantidade de pessoas que compõem a força de trabalho nacional e estão desocupadas vem aumentando: ela também mantém perfil parecido com o nível de desocupação – vem de uma tendência de crescimento desde o ano anterior, depois se mantém estável entre fevereiro e maio de 2016 e volta a crescer, fechando o trimestre junho-agosto em 11,8% (com um aumento de 0,6% quando comparado ao trimestre março-maio; e um aumento de 3,1% quando comparado ao mesmo trimestre de 2015).

Propostas do governo para o mercado de trabalho e direitos sociais

É importante entender as mudanças do mercado de trabalho, bem como das questões sociais, à luz dos últimos acontecimentos no cenário político brasileiro. O anúncio (e aprovação em primeiro turno) da PEC 241 traz uma proposta de austeridade com os gastos públicos. Por meio dela, o atual governo pretende congelar os gastos com áreas importantes para o desenvolvimento social no país (saúde, educação, Previdência e gastos sociais, por exemplo), por vinte anos. Basicamente, o governo estipula um teto para as despesas primárias, com base no ano de 2016, e promove reajustes anuais com base na inflação acumulada (o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA). Atualmente, os gastos com saúde e educação, por exemplo, têm sido feitos a partir da arrecadação federal, e com a nova regra, eles não poderão superar a inflação.

Os idealizadores da PEC justificam sua existência para solucionar o problema fiscal no Brasil por meio do congelamento dos gastos – isso porque, segundo o Ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, atualmente a Receita é insuficiente para superar os gastos do governo. O objetivo desta medida seria produzir boas expectativas para o mercado – com isso, pressupõe-se que haverá aumento dos investimentos e, consequentemente, melhora no crescimento econômico.

Esta PEC reflete um viés pautado nos ideais neoliberais já testados no Brasil há pouco mais de vinte anos e que não gerou bons resultados. Contudo, seus idealizadores defendem que é uma política também para os pobres, pois, segundo eles, o cenário econômico atual favorece a não realização do investimento, afetando negativamente o nível de emprego – assim, o desemprego seria fruto deste cenário. A PEC induziria à recuperação econômica e, portanto, à criação de empregos, beneficiando os mais pobres, conforme defende o chefe da assessoria especial do Ministério da Fazenda, Marcos Mendes.

Porém, os críticos da austeridade não concordam com esta ideia. Para estes, a PEC está penalizando imediatamente os mais pobres sob a promessa de uma melhoria futura. As políticas sociais diretamente afetadas pela PEC, embora possam ser acessadas por todos os cidadãos brasileiros, afetam mais diretamente os mais pobres. É o caso da saúde e educação públicas, por exemplo, que teriam seus gastos reduzidos com a proposta. Assim, ela estaria submetendo as questões sociais aos anseios e expectativas do mercado. Isto é, faz-se uma escolha em se promover pioras nas condições sociais, no presente, em função de produzir um cenário que agrada o mercado, na esperança de que ele irá responder com investimentos que produzirão crescimento econômico e, consequentemente, melhoras nas questões sociais, no futuro.

Para os opositores da proposta, se aprovada, a PEC 241 será responsável por sucatear algumas áreas, como a saúde e educação, por exemplo. Com o congelamento dos gastos, os problemas que já existem nestas áreas se tornarão ainda maiores, incapazes de serem solucionados. Além disso, mesmo que a economia se recupere antes dos vinte anos da proposta, não há previsão de que os gastos nestas áreas estratégicas voltem a crescer.

Uma simulação feita em um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra as possíveis perdas na área de educação, por exemplo: caso a medida estivesse em vigor desde 2003, os gastos de 2016 com saúde teriam sido encolhidos em R$ 257 bilhões (uma redução de 42,1%). Segundo o estudo, com esta perda, o Sistema Único de Saúde (SUS) seria praticamente inviabilizado.

Além desta proposta, que fere diretamente as questões sociais, o atual governo prevê medidas para o mercado de trabalho, como é o caso da proposta de reforma trabalhista, que prevê três tipos de mudanças: a primeira é a Reforma nas Leis Trabalhistas, por meio da flexibilização da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), sob a justificativa de reduzir a burocracia e simplificar a CLT.

A segunda reforma é dar sequência à regulamentação da terceirização – a Câmara dos Deputados aprovou, em abril de 2015, projeto que permite a contratação do trabalhador terceirizado para todas as atividades das empresas privadas (atualmente, a terceirização é permitida apenas em alguns setores). Vale lembrar que os sindicatos e demais órgãos de proteção dos trabalhadores vêm lutando contra a terceirização e a favor da ampliação dos direitos trabalhistas já há alguns anos, justificando seu malefício para o trabalhador e para o mercado de trabalho.

A terceira reforma é a proposta de que Programa de Proteção ao Emprego (PPE), que defende a preservação dos postos de trabalho por meio da redução salarial e da jornada de trabalho, em tempos de crises, se torne uma política permanente.

Além destas, existem ainda: proposta de ampliação da jornada de trabalho para 48 horas semanais (com tolerância de 12 horas diárias), e a reforma da Previdência, com aumento da idade mínima para se aposentar. Em todas estas propostas, o que se nota é que elas penalizam o trabalhador, colocando-o em situação de desproteção e insegurança, reduzindo seus direitos, sob a justificativa de que estas seriam medidas necessárias para garantir o crescimento econômico.

Este cenário exige atenção aos próximos sinais do mercado de trabalho e da questão social no Brasil: as perdas do mercado de trabalho que, por enquanto, vêm afetando a quantidade dos postos de trabalho, já dão sinais de que começarão a afetar, também, a qualidade do trabalho e as remunerações – uma vez havendo desemprego crescente e aumento da informalidade, aumenta a concorrência entre os trabalhadores e dificulta as lutas pelas melhorias nas condições de trabalho.

As perdas também podem afetar conquistas como a valorização do salário mínimo, que ocorreu durante a primeira década do século 21 e que garantiu ganhos importantes para os trabalhadores, como o acesso a um conjunto de bens e serviços que antes eram exclusivos das classes média e alta no Brasil (em saúde, educação, especialmente com acesso ao ensino superior universitário, acesso a lazer, aquisição de imóveis e automóveis etc.). Outra conquista bastante importante foi a ampliação dos direitos trabalhistas às empregadas domésticas, garantindo a elas direitos que antes eram exclusivos de trabalhadores da indústria e do comércio, como por exemplo, jornada de trabalho de 44 horas semanais, pagamento de horas extras, adicional noturno, entre outros.

Ainda no campo das questões sociais, é importante ressaltar os avanços no combate à extrema pobreza no Brasil, que ocorreu também na primeira década deste século: os programas de transferência de renda, embora oferecessem pequenas rendas à pessoas muito pobres, resolveram um dos mais graves problemas sociais do Brasil, a miséria, reduzindo-a significativamente e garantindo alimentação para boa parte das pessoas que viviam em situação de total vulnerabilidade social.

O cenário atual parece ser de reversão destas conquistas e de início de perdas para a classe trabalhadora.

 

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