General e advogado de Bolsonaro são alvos da operação  autorizada pelo Supremo que investiga venda de “presentes” recebidos em viagens ao exterior. PF quer a quebra dos sigilos

Uma nova operação tabajara foi desvendada pela Polícia Federal na apuração de crimes contra a ordem tributária, lavagem de dinheiro, peculato e improbidade, envolvendo auxiliares diretos e amigos do ex-presidente Jair Bolsonaro. Na manhã de sexta-feira, 11, agentes federais cumpriram mandados de busca e apreensão em endereços de pessoas próximas do líder da extrema-direita.

Os mandados foram determinados pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) e foram cumpridos em Niterói, no Rio de Janeiro; em São Paulo e em Brasília. A investigação da PF aponta a suspeita de que Bolsonaro utilizou a estrutura do governo federal para desviar presentes de alto valor oferecidos a ele por autoridades estrangeiras.

A informação foi relatada em decisão de Moraes, a partir de relatório da PF que embasou a autorização para a operação. Foram alvos o general da reserva do Exército Mauro Lourena Cid, pai do ex-ajudante de ordens Mauro Cid, Frederick Wassef, advogado de Bolsonaro, e Osmar Crivelatti, tenente do Exército e que também atuou na ajudância de ordens da Presidência. Todos estariam envolvidos na venda de jóias. A medida é considerada um passo para a prisão do ex-presidente.

Ainda na sexta, a PF pediu ao Supremo a quebra de sigilo fiscal e bancário de Bolsonaro na investigação que apura um suposto esquema de desvio de joias e outros itens de luxo para o patrimônio privado do ex-presidente. A investigação também solicitou que ele seja ouvido no inquérito. Bolsonaro nega desvio ou apropriação de ‘bens públicos’.

A PF também quer ouvir a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro e acionou o FBI, a polícia americana, para avançar nas investigações nos Estados Unidos. Apesar disso, a avaliação é que os indícios e provas já seriam suficientes para, por exemplo, prender o general.

Além dos militares, também foi realizada busca em endereços do advogado Frederick Wassef, que atende à família Bolsonaro. “Os investigados são suspeitos de utilizar a estrutura do Estado brasileiro para desviar bens de alto valor patrimonial, entregues por autoridades estrangeiras em missões oficiais a representantes do Estado brasileiro, por meio da venda desses itens no exterior”, relatou a PF.

Apenas três itens supostamente desviados alcançam cerca de R$ 900 mil, nas contas da PF — cerca R$ 588 mil de um kit de joias com relógio da marca Chopard, colocado à venda em uma leiloeira de Nova York, mas que não chegou a ser comercializado. E mais R$ 333 mil de outros dois relógios, sendo um Rolex, que chegou a ser vendido, mas depois foi recomprado para devolução ao patrimônio público.

Cid já vinha sendo investigado pela PF por desvio de bens do patrimônio público e também é investigado pela falsificação do cartão de vacina do ex-presidente e da filha de Bolsonaro. Ele agora é alvo pela suspeita da venda de jóias e outros presentes dos governos árabes.

O general que foi alvo da PF é amigo de turma do ex-presidente quando era cadete da Academia Militar de Agulhas Negras (Aman), em Resende, no sudoeste do Rio, nos anos 1970. Tido por outros militares como discreto e de personalidade conciliadora, o general dirigiu o Departamento de Educação do Exército e passou à reserva em 2019 para assumir um cargo em Miami, nos Estados Unidos, no início do governo Bolsonaro.

O outro investigado é Osmar Crivelatti, que também foi da ajudância de ordens da Presidência. Em 6 de junho de 2022, ele assinou a retirada de um Rolex do “acervo privado” para o gabinete. O relógio, avaliado em R$ 300 mil, foi doado pelo rei da Arábia Saudita, Salman bin Abdul-aziz em uma viagem oficial e teria sido negociado por Mauro Cid.

Já Wassef teria recuperado o relógio Rolex em março deste ano nos Estados Unidos. Em abril, entregou a jóia para Mauro Cid em São Paulo. Wassef era dono do imóvel em Atibaia onde o policial aposentado Fabrício Queiroz foi preso, em junho de 2020.

Trupe colocou presentes em site de leilão

O kit de joias masculinas recebido pelo então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, após viagem à Arábia Saudita em 2021, estava à venda em um site de leilões dos Estados Unidos em fevereiro deste ano. De acordo com o site onde o material foi anunciado, o lance inicial era de US$ 50 mil. O valor estimado variava entre US$ 120 mil e US$ 140 mil – entre R$ 588 mil a R$ 686 mil, aproximadamente.

A PF constatou que “o número de série do relógio anunciado no site Liveauctioneers.com é o mesmo número registrado no acervo privado do ex-presidente Jair Bolsonaro, recebido em 29 de novembro de 2022, por meio do processo SEI 08500.018470/2023-03. 

Segundo a investigação da PF, Bolsonaro só pôde devolver as joias ao Estado brasileiro no fim de março, após determinação do Tribunal de Contas da União (TCU), pois elas não haviam sido arrematadas. Em 8 de fevereiro de 2023, o kit foi submetido a leilão, mas não foi arrematado, não sendo vendido por circunstâncias alheias à vontade dos investigados. 

Após decisão do TCU para que o kit fosse devolvido ao Estado brasileiro, os investigados internalizaram os bens, devolvendo-os na data de 24 de março de 2023 na agência da Caixa Econômica Federal em Brasília. A PF aponta que o kit de joias foi levado por Cid no mesmo avião em que viajou Bolsonaro, em 30 de dezembro, na véspera do fim de seu mandato.