Mesa que tratou do tema no Seminário Nacional do PT e da FPA apontou, a partir das novas realidades, os caminhos de diálogo e o que pensam os trabalhadores da cidade e do campo

Foto: Site do PT

No segundo dia do seminário nacional A realidade brasileira e os desafios do Partido dos Trabalhadores, promovido pelo PT em parceria com a Fundação Perseu Abramo, em Brasília, a mesa “O novo mundo do trabalho” abordou as principais complexidades das atuais formas de empregabilidade e renda no Brasil. Dentre os debatedores, participaram trabalhadores e pesquisadores do assunto.

“Trabalho não é sinônimo de emprego e empreendedor não é sinônimo de precarizado”, sintetizou Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva. O comunicólogo trouxe dados de pesquisas qualitativas sobre o cenário, a partir do que pensam os trabalhadores, tanto empreendedores quanto formalizados com a CLT.

Nas periferias, 79% dos empreendedores têm como meta principal ampliar seus negócios e abrir novos empreendimentos. Apenas 9% desejam um emprego com carteira assinada, segundo os dados compilados pelo instituto. 

Além disso, um ponto considerado relevante pelo palestrante é o de que a associação entre o sucesso nos negócios e as ações do governo não são imediatas. Em ordem de prioridades, ao serem perguntados sobre o assunto, 46% responderam que prosperaram por mérito próprio, seguidos pelas respostas: “Deus”, “minha família”, “sorte” e, em 5º lugar, as ações do governo federal. 

Para compreender o universo empreendedor no país, é necessário falar sobre as novas tecnologias e as formas de organização a partir das plataformas, destaca Meirelles. São mais de 11 milhões de brasileiros que adquirem sua renda por meio dos aplicativos — não apenas como entregadores diretos, mas com a possibilidade de disseminar melhor as entregas da sua produção, como é o caso, por exemplo, de boleiras, que se beneficiam com o Ifood, e artesãos, que podem vender utilizando o Mercado Livre.

Renato Meirelles pontuou que a percepção das pessoas em relação à CLT mudou bastante nos últimos anos, especialmente após as mudanças promovidas pela Reforma Trabalhista. “As pessoas enxergam que têm menos acesso aos direitos, menos segurança e estabilidade, menos possibilidade de planejamento de futuro a partir da aposentadoria”, diz. 

Para o pesquisador, é importante entender o que leva as pessoas a escolherem o empreendedorismo como uma opção melhor. “Não dá pra achar que apenas um modelo é liberal e o outro não, muitas vezes, os dois modelos representam precarização”, opina o presidente do Instituto Locomotiva.

A categoria dos motoboys por aplicativos

O motoboy Nicolas Santos, morador de Juiz de Fora, começou a trabalhar com aplicativos em 2019 como motorista da Uber, mas fez a opção por trabalhar com moto devido a pandemia. “Nossa categoria tem muita resiliência e força”, pontua. 

Santos falou sobre o controle exercido pelas plataformas aos mais de 370 mil trabalhadores ligados diretamente à plataforma Ifood. “Nos dois últimos anos, estão implementando esse controle, a autonomia é inexistente. Não tenho mais a possibilidade de colocar o meu preço no meu trabalho como era antes da plataforma. A subordinação é escancarada.”, afirma o motoboy da Aliança Nacional dos Entregadores por Aplicativos, a Anea. 

Nicolas Santos alertou que o Supremo Tribunal Federal deve promover uma audiência pública para debater “estranhamente” se os motoboys são considerados trabalhadores ou parceiros das plataformas. “Caso haja o entendimento de que não somos trabalhadores, perdemos um instrumento importante que é a Justiça do Trabalho”, lamenta. 

Questões trabalhistas no campo

Militante petista, produtora de café do Espírito Santo, Mônica Bufon destacou que “o debate do mundo do trabalho não é só urbano”. Dentre as principais questões, a agricultora cita o êxodo rural que, somente nos últimos 10 anos, tirou mais de 1,4 milhões de jovens do campo. 

“Os últimos dois governos tiveram um impacto muito grande para o trabalhador rural”, lembra Bufon. Outro ponto considerado importante são as questões climáticas que, segundo a trabalhadora, interferem diretamente no bem viver e nas condições de produção da agricultura familiar. 

Formalização e defesa das conquistas

O estudioso do assunto, presidente do Conselho Nacional do SESI, Fausto Augusto Junior, aponta que “temos uma tendência de usar as ferramentas teóricas do século XX para analisar a realidade do século XXI”. Fausto fez o comparativo de que a realidade dos números do mundo do trabalho (informalidade, autônomos, empregadores, taxa de desemprego) pouco mudou nos últimos 10 anos. E destacou que, apesar disso, é preciso que seja feita uma interpretação com cautela. 

Mesmo com a forte presença do tema do empreendedorismo, “a maior parte das pessoas que estão trabalhando hoje são trabalhadores formalizados, a temperatura do debate da escala 6×1 nas redes mostrou isso”, diz Fausto. “Não tem sentido fazer oposição entre o formal e o informal, nós somos classe trabalhadora. Nosso desafio é trazer melhoria de qualidade de vida para os trabalhadores em geral”, pontua o pesquisador. 

Para Fausto, “nós continuamos fazendo o debate individual, os bolsonaristas dialogam com a família”. Segundo ele, programas como o BPC (Benefício de Prestação Continuada) e o Bolsa Família são importantes para a renda da família e é importante que o tema seja defendido com esse viés; “é uma disputa coletiva”, diz.

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