Abraão Lincoln Ferreira, da Confederação Brasileira dos Trabalhadores da Pesca e Aquicultura, foi preso em flagrante após contradições sobre o esquema de descontos ilegais a aposentados durante o governo Bolsonaro


Presidente de confederação de pescadores é preso por mentir na CPMI do INSS
O presidente da CPMI do INSS, senador Carlos Viana, e o depoente, Abraão Lincoln, na reunião desta segunda Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado

O presidente da Confederação Brasileira dos Trabalhadores da Pesca e Aquicultura (CBPA), Abraão Lincoln Ferreira, foi preso em flagrante por falso testemunho ao final do depoimento prestado à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS, na noite desta segunda-feira (3). A prisão ocorreu após parlamentares apontarem contradições nas declarações do depoente sobre sua relação com o esquema de descontos indevidos a aposentados.

Durante as arguições, parlamentares da base governista afirmaram que Lincoln comandava um “cartório sindical”montado durante o governo Bolsonaro para desviar recursos de aposentados por meio de Acordos de Cooperação Técnica (ACTs). O esquema teria causado prejuízo superior a R$ 200 milhões, por meio de descontos indevidos aplicados aos beneficiários do INSS.

Contradições e mentiras comprovadas

O relator da CPMI, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), pediu a prisão após apontar que Lincoln mentiu em pelo menos quatro momentos ao longo de mais de oito horas de depoimento. Ele teria mentido sobre o motivo de sua saída da Confederação Nacional dos Pescadores e Aquicultores (CNPA), alegando ter renunciado ao cargo, quando, na verdade, foi afastado por decisão cautelar.

Lincoln também negou, pelo silêncio, conhecer Antônio Carlos Camilo Antunes, o Careca do INSS, mas admitiu o vínculo ao responder a perguntas de outros parlamentares. Outras inconsistências envolveram sua relação com Gabriel Negreiros, tesoureiro da CBPA, e o alcance da procuração outorgada a Adelino Rodrigues Júnior.

Lei sob medida e ACT questionável

O deputado Alencar Santana (PT-SP) destacou que a Lei 14.441/2022 foi feita “sob encomenda” para beneficiar a CBPA, permitindo a existência de duas confederações de pescadores artesanais. A norma foi assinada pelo então presidente Jair Bolsonaro, pelo ministro Paulo Guedes e por José Carlos Oliveira, ex-diretor de benefícios do INSS.

Santana alertou que “dessa vez as dificuldades serão bem maiores” e afirmou que o “ex-presidente Bolsonaro também vai para Papuda” por crimes como “genocídio na época da COVID”, “omissão nesse caso do INSS” e “tentativa de golpe”.

“História de pescador”

O deputado Paulo Pimenta (PT-RS), líder da base do governo, afirmou que o esquema foi montado entre 2021 e 2022, e que o governo Lula “desbaratou a quadrilha”, devolvendo “o dinheiro roubado dos aposentados”.

“Presidente, eu diria: não pode ser verdade. Isso deve ser história de pescador, porque uma história como essa ninguém vai acreditar.”

Pimenta seguiu na analogia, lembrando que, como pescador, Abraão Lincoln “sabe que tem que ter diário de bordo”, mas compareceu à sessão “sem nada anotado”.

O parlamentar listou o que chamou de absurdos da CBPA: o crescimento “da noite para o dia”, com 180 mil novos filiados em um mês, além da solicitação de descontos para 40 mil pessoas já falecidas. Ele também questionou o repasse de R$ 2 milhões da CBPA para a empresa F2A Tecnológica, perguntando por que Lincoln entregava “dinheiro de aposentados para essa gente comprar Ferrari, Lamborghini, Rolex e abrir contas em paraísos fiscais”.

Procuradoria alertou, governo ignorou

O senador Fabiano Contarato (PT-ES) citou o parecer do procurador federal Leandro Santos da Guarda, que havia recomendado não assinar o ACT devido à “existência de investigação criminal contra o presidente da CBPA”.

Em contraste, leu o despacho do chefe da Divisão de Consignação e Benefícios do INSS, Jucimar Fonseca da Silva, que declarou não haver obstáculo para a formalização do acordo.

Contarato destacou que a autorização do ACT, assinada em 13 de julho de 2022, “com a marca do governo Bolsonaro”, custou aos aposentados quase R$ 200 milhões em descontos indevidos”.