Texto do governo Lula é tratado como prioridade e enfrenta resistência do PL e da bancada da bala no Congresso

Governo aposta na Lei Antifacção para desarticular o crime organizado; PL é contra
Fernando Frazão/Agência Brasil


O governo federal apresentou ao Congresso Nacional o projeto de lei conhecido como Lei Antifacção, considerado um dos pilares da nova política de segurança pública da gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva

Elaborada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, a proposta busca dar ao Estado mais poder para enfrentar o crime organizado, em especial as facções que controlam territórios, impõem regras próprias e desafiam o poder público em diversas regiões do país.

O texto chega ao Congresso em um contexto de expansão da influência de grupos criminosos, tanto em grandes centros urbanos quanto em áreas rurais, e já provoca resistência da extrema-direita, como o Partido Liberal (PL), que prometem obstruir sua tramitação. 

Para o governo, a lei é um instrumento essencial para recuperar territórios dominados e garantir segurança à população, combinando rigor penal e políticas sociais. O projeto tramita em regime de urgência e é tratado pelo Planalto como prioridade legislativa.

“O Brasil não pode mais aceitar a existência de Estados paralelos dentro do país”, afirmou o presidente Lula, ao anunciar o envio do projeto. Segundo ele, o texto representa um marco no enfrentamento ao crime organizado e uma resposta do Estado à violência que atinge as periferias.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, reforçou que o projeto foi elaborado com base em contribuições de governos estaduais e forças policiais, com equilíbrio entre firmeza e respeito às garantias constitucionais. “É um combate enérgico às facções criminosas, mas dentro do Estado Democrático de Direito”, disse. “O projeto atende a um anseio da sociedade brasileira e do Parlamento”, completou o ministro.

Governo aposta na Lei Antifacção para desarticular o crime organizado; PL é contra
“O Brasil não pode mais aceitar a existência de Estados paralelos dentro do país”, afirmou o presidente Lula ao assinar o Projeto de Lei Anti-Facção, ao lado dos ministros Ricardo Lewandowski e Rui Costa, no Palácio do Planalto (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

Um novo marco no combate às facções

De acordo com o Ministério da Justiça, a Lei Antifacção foi construída a partir da experiência brasileira de combate ao crime organizado desde 2013 e também de práticas de outros países latino-americanos. A diferença, explicou o ministro, está no foco: a nova proposta concentra-se nas organizações que exercem controle territorial e econômico — consideradas a forma mais destrutiva e violenta do crime contemporâneo.

Entre os principais dispositivos, o projeto cria o crime de “organização criminosa qualificada”, direcionado a grupos que exerçam domínio de territórios ou de atividades econômicas com uso de violência, armas de alto poder ou aliciamento de crianças e adolescentes. Nesses casos, as penas previstas variam de 8 a 15 anos de prisão, podendo ser ampliadas para líderes e financiadores. 

O texto também endurece a resposta penal a homicídios cometidos por ordem de facções, estabelece agravantes específicas e autoriza a infiltração de agentes em investigações complexas, sempre mediante autorização judicial.

Outra frente central é o bloqueio de bens e valores ligados a organizações criminosas, a suspensão de contratos públicos de empresas envolvidas e a proibição de contratar com o Estado por até 14 anos, em caso de comprovada ligação com facções. A ideia é atacar a base econômica do crime, impedindo que o dinheiro proveniente de atividades ilegais continue alimentando estruturas de poder e corrupção.

O jurista e especialista em segurança pública Fernando Capano afirmou que a proposta “aumenta o poder do Estado e das forças policiais para enfrentar facções” e destacou que ela “prevê penas compatíveis com a gravidade das organizações criminosas, podendo chegar a 30 anos em casos de liderança”. A declaração foi feita em entrevista à imprensa paulista, na avaliação do impacto jurídico do projeto.

Integração e tecnologia na segurança pública

A proposta também amplia a integração entre a Polícia Federal e as forças estaduais, com um sistema nacional de cooperação e compartilhamento de informações. 

Segundo o Ministério da Justiça, a intenção é criar um modelo permanente de articulação, fortalecendo o trabalho de inteligência e a prevenção de crimes de grande impacto. 

O texto ainda prevê o uso controlado de tecnologias de rastreamento, monitoramento financeiro e cruzamento de dados, sob supervisão judicial, como forma de aprimorar as investigações.

Bancada do PT defende aprovação da lei

Governo aposta na Lei Antifacção para desarticular o crime organizado; PL é contra
O deputado Flávio Nogueira (PT-PI), membro titular da Comissão de Segurança Pública da Câmara, afirmou à Focus Brasil que a Lei Antifacção é “um passo decisivo para consolidar uma política nacional de segurança baseada em firmeza e inteligência”. Foto: Câmara dos Deputados

Procurado pela Focus Brasil, o deputado Flávio Nogueira (PT-PI), membro titular da Comissão de Segurança Pública da Câmara, afirmou que a Lei Antifacção “é um passo decisivo para consolidar uma política de segurança nacional que una firmeza e inteligência”. Para ele, o texto “coloca o Estado novamente no centro da estratégia de enfrentamento ao crime organizado, de forma coordenada e permanente, com base em planejamento e integração”.

A bancada do PT defende a aprovação do projeto e tem atuado na Câmara para garantir sua tramitação em regime de urgência. Em nota, os parlamentares afirmaram que a Lei Antifacção “moderniza o combate ao crime organizado por meio de inteligência e descapitalização, em vez de apostar apenas em ações de confronto”.

O líder do partido na Câmara, deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), destacou que a iniciativa é “uma ofensiva estrutural contra o crime, porque mira o dinheiro e o controle territorial das facções”.
A deputada federal Adriana Accorsi (PT-GO), delegada e integrante da Comissão de Segurança Pública, acrescentou que “a proposta representa um avanço no enfrentamento ao crime, com integração entre as polícias e fortalecimento do Estado”.

Resistência da extrema-direita e tramitação no Congresso

Apesar do apoio da base governista, a proposta enfrenta resistência da extrema-direita e do PL, que classificam o texto como “excessivamente abrangente”. 

Parlamentares da chamada bancada da bala, como Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e o senador Ciro Nogueira (PP-PI), afirmaram que o endurecimento das penas “não é suficiente” e defenderam projetos paralelos que tratem facções criminosas como grupos terroristas.

Para o governo, as críticas têm motivação política. O Planalto sustenta que o projeto é o mais completo já elaborado para combater o crime organizado e que busca combinar rigor penal com medidas sociais e preventivas. 

“O Estado precisa ter instrumentos modernos para romper o poder paralelo das facções e proteger a população das periferias”, afirmou Lewandowski. O governo trabalha para que o texto seja votado ainda neste ano, em regime de urgência constitucional.

*Colaboraram Fernanda Otero e Henrique Nunes

Edição: Guto Alves